Peço atenção E DESCULPAS, pois o texto de hoje é longo, mas
é super-válido. ;)
A querida companheira estava dirigindo hoje cedo a caminho
do trabalho e eu, no banco do passageiro, sintonizei a Rádio Eldorado (tinha
propaganda nas outras emissoras e fiquei caçando algo para ouvir...) e, de
repente, ouço “Woodstock” de Crosby, Stills, Nash & Young e sinto uma
nostalgia, vai lá saber se isso é porque a década de 60 é a época que mais
gosto da música popular mundial – vide a música brasileira dessa época, cada
composição linda – ou uma questão sentimental por conta de alguns discos que
ouvi sentado ao lado de meu pai, um apreciador de música, mas a questão é que
este disco, especificamente, este pequeno e curto álbum chamado “Déja Vù” desse
quarteto, acompanhado de Dallas Taylor (bateria) e Greg Reeves (baixo),
devidamente creditados e fotografados NA CAPA, tem sido parte da trilha sonora
de minha vida, mesmo não tendo vivido naquela época. Não sei dizer o que raio
de sentimento aflora quando ouço esse disco, só sei que é um daqueles poucos
que posso dizer algo do tipo “me sinto em casa”. Meu pai não tinha esse disco,
mas falava dele como se fosse algo fenomenal, de outro mundo, mas nunca achou
para comprar fácil e num preço bom – a classe média na década de 80 e 90 não
era abastada, com tanta inflação, comprava-se o pão da semana, pois no dia
seguinte a subida de preço era vertiginosa. Recentemente o ouvi conversando com
um amigo, lembrando como era difícil para eles até fazer compras, pois tinham
que sair correndo antes que o etiquetador de preços do supermercado aumentasse
o valor de cada produto, eram os bons tempos de ditadura, economia fantástica, importação
PROIBÍDA, tecnologia defasada e mal se podia ouvir Chico Buarque, Geraldo
Vandré, Titãs, etc, sem a avaliação da censura sobre o que deve ou não ser
absorvido culturalmente: TUDO MIL MARAVILHAS. Vou parar JÁ com o discurso
político (foi só para estabelecer um cenário real) e vou retomar a história.
Enfim, meu pai não tinha esse disco e eu, já com 12 anos e viciado em música
(doses cavalares diárias) em 1996, comecei a fuçar nas locadoras de CDs por
discos novos, bandas novas; o MP3 apareceu na minha frente só no ano seguinte,
e demorava no mínimo uma hora para baixar um arquivo de música com péssima
qualidade de áudio. Conheci muita coisa, pegava CDs emprestado, copiava em
fitas, emprestava CDs, trocava fitas com amigos (tínhamos o costume de pegar um
CD novinho e ouvi-lo seguidas vezes, copiando uma fita por vez para cada um),
mas alguns discos ficavam na minha mente como pulga atrás da orelha... Na
verdade, muitos discos ficaram como pulga, coçando minha curiosidade, eu via as
capas (a internet tinha acabado de chegar à casa dos meus tios) quando buscava
por nomes no “Yahoo!” ou no “Cadê?”, e ficava besta tentando adivinhar como
seria cada disco, de acordo com as referências que tinha até então. Só quando
fiz 15 anos fui ouvir tal disco, já ouvia heavy metal e tentava, como qualquer “aborrescente”,
renegar qualquer autoridade familiar e suas culturas, mas não conseguia NÃO
GOSTAR das músicas que meus pais ouviam, nunca consegui DESGOSTAR (diferente de
“enjoar”) do que gostei até então, então o Sr. Headbanger Babaca que vos fala
ouvia Marisa Monte, Toquinho e Vinicius, Pink Floyd, Genesis, Yes, Fleetwood
Mac, Elton John, Tim Maia, Alcione, Jethro Tull, UB40, Simone, Cidade Negra, Fagner,
Chico Buarque, Djavan e outras coisas, tudo misturado com o metal e a música atual
da época, Planet Hemp, Nação Zumbi (com o Chico), Raimundos, Skank, a cena
Grunge, mas tudo escondido no mundinho do meu quarto. Falar para os amigos que
eu gostava de Commodores? Não... Que eu cantava com os discos do Zé Ramalho???
Nem pensar!!! Que besta eu era... Achava que isso importava muito. Fiz amizades
na escola, algumas dessas duram até hoje, e o pai de um deles tinha (e ainda
tem) uma coleção, invejável, a maior que tinha visto naquela época. E PASMÉM,
ele tinha o disco que meu pai me falou e despertou minha curiosidade por tantos
anos. Eu não tinha ideia do que ouviria, já conhecia Neil Young e gostava
muito, conhecia o David Crosby, mas ainda como guitarrista do Byrds, também já
ouvira Hollies do Graham Nash e o Buffalo Springfield do Stephen Stills (e Neil
Young), mas nunca tinha ouvido na vida esse timaço junto. Quando apertei play,
dei de cara com um folk rock psicodélico diferente, quatro vozes fazendo um
coro que ressoa até hoje na memória, músicas passando por diversos climas, do blues
ao jazz ao experimental, mas sempre com uma linguagem popular e de fácil
assimilação, mas não pense que é um disco bunda, é diferente de tudo. Quando
meu pai chegou do trabalho e viu o CD que peguei emprestado, ficou feliz,
lembro disso até hoje, deu um jeito de ouvir bastante antes de eu devolver (ele
não tinha mais toca-fitas no carro, mas também não tinha como copiar o CD).
Para você entender a alegria do meu velho, a minha alegria e a alegria do
festival de Woodstock, você tem que saber que esse supergrupo foi o único na
história que conseguiu rivalizar em popularidade com os Beatles no hemisfério
norte, em sua curta duração. Esse disco é tão influente que ouço nuances dele
em vários artistas folk, mas a obra inteira é uma viagem completa. Difícil você
não se sentir numa fazenda enquanto ouve “Our House”, muito mais difícil você
não sentir nostalgia de um lugar onde você nunca botou os pés ao ouvir “Helpless”.
Difícil não sentir a angústia de “Almost Cut My Hair”, difícil não se deixar
levar com “Carry On” (trocadalho do carilho?)...
Difícil ouvir apenas uma vez.
Depois que ouvi, larguei a mão, mostrei para todo mundo, a
maioria torceu o nariz por não ter um solo na velocidade da luz, por não ter
guitarras com distorções no talo, um baixo reto e pulsante ou uma bateria que
mais parece metralhadora, mas eu não consegui desgostar desse disco, nunca
consegui, é um dos poucos discos que é um porto seguro, sempre volto para ele,
e nem é o meu favorito, nem de meu pai, mas tem um lugar guardado no meu
coração. Foi por causa desse disco, especificamente, que admiti que gosto de
música, acima de qualquer definição de estilo ou gênero. Dali para frente, não
sentia que precisava esconder que gosto de samba, bossa nova, funk, reggae,
ska, soul, r&b, rock, heavy metal, brega, música erudita, jazz, etc...
Não sei se você vai gostar desse álbum, mas fica aqui o link
para vossa apreciação, talvez você tenha um choque, mas não se preocupe, apenas
feche os olhos e dê toda atenção que puder apenas à música. Esse pequeno grande
álbum não pode ser esquecido, nunca!
Se puder, quiser e não for atrapalhar, comente falando o que
achou do disco. J
www.youtube.com/watch?v=RnOXkedBmRs
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Texto: Ernesto Gennari Neto.
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