terça-feira, 28 de janeiro de 2014

EXTRA: Fodas chuvosas

Arma a chuva

e uma vulva
encharcada
está roxa
como uva
colhida
madura.
A boceta muda
não fala
mas se expressa
ao falo
e à língua,
e não gosta
de pressa,
sem calma
a alma
não se interessa
por sexo,
versos sem nexo
nada complexos,
eu e você:
côncavo e convexo;
e a chuva
cai lá fora,
céu roxo
escuro,
sem muros,
escrevo nosso furo:
fodas
nas noites chuvosas
afora.

Cobras

Sem sombras,
fico com sobras
de minhas obras
sem brio,
e, sobriom,
sinto as cobras
que me cobram,
me esmagam,
me dobram
em dois,
três,
depois
desfez.
Apaguei.
Cansei.
Me neguei.
Acabei
envenenando
este poema:
o matei.

terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Ventos Virão (em 3 partes)

I:

O vento a soprou
para longe
pois não aguentou
segurar onde
sempre segurou;
num farfalhar
o caule a soltou,
uma folha a voar;
um galho quebrou
e caiu de seu lar.
Os ventos vem e vão
sem sequer pensar
em quem afetarão
e podem quebrar
tronco e espigão...
...Sem distinção.

--

II:

Se você é vento,
não seja um tufão,
sem dó ou direção,
seja como brisa,
que passa lisa
aliviando a contento.

--

III:

Sim, ventos virão,
comuns, e alguns são bons,
outros, talvez não.

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

"Miragem (sem terra à vista)"

Imagem passando ao largo
da margem do copo amargo,
silhueta sua,
tua carne nua.

O sal de seu suor na língua
desfaz o mal que já míngua
no seu gemido
bemol e sustenido...

Todo dia desenho e apago
na sua pele, com afagos
e carinhos,
seus caminhos

cheio de curvas sinuosas
nessa paisagem tortuosa
de seu corpo,
dos mares, porto

que está no meu mapa.
Escrevo sem as papas
sobre o X
que ali fiz

para marcar o tesouro,
que tenho num estouro,
de tão precioso
e tão gostoso

quanto fazer essa analogia
ao mar e à cartografia,
apologia ao sexo
e amor sem preço.

Vendo o copo de bebida
miro seu corpo de tulipa,
mas estou sozinho
e bêbado de vinho.

Penso, então:

Tem tanto mar além de você,
mas só sua miragem me vê.
E nela nos vejo,
lhe desejo...

--

Mais um poema para o projeto Curare.
Dessa vez explorando mais o imaginário e usando formas não estruturadas de versos e métricas, mas organizado em estrofes similares.

--

Para a miragem.

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Contagem regressiva para 30: 9 [Parte 2]

Gritou me cedo: "NOVE! NOVE!"
Me confundi, era muito mais suave,
dizia algo como "Vê se move.",
cedo no escuro, mas com voz leve.

Seria sonho ou pesadelo? Não sei.
Devaneio não tem modelo.

No banho o chuveiro chove
deixo que a água me lave
e deixo que a voz trove
uma música que comove.

Seria apenas um banho, mas sei
que ainda estou estranho.

Será que, como nove vira noventa,
eu passo inteiro pelos sessenta?
Mas estou prestes a fazer trinta,
e peço, lhe imploro, que minta.

Data-me dezenove. Já sei
que tenho vinte e nove.

Dias? Faltam apenas nove.
Então lhe peço que prove
minha alma e carne. Me leve
antes que alguém me desove.

Pois quero que me sinta. Só sei
disso agora, prestes aos trinta.

E às dezenove, antes das nove
na noite de hoje, estarei leve
mas depois me soque, me sove
e se puder, me escove.

Que os trinta tragam novas tintas,
pois as velhas, a velhice remove.

Senão me faça esquecer de trinta,
nove ou vinte e nove.

--

My love.



quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

Contagem regressiva para 30: 10 [Parte 1]

De dez em dez
tanto fez que fez
chegou aos trinta.
Olha que drama...
melhor, sinta.
Não há dama
que não teme
e não treme
quando vê a data.
Parece trama,
de um homem
que não se mata
mas ali também
percebe, se sente
mais perto da morte.
"Mas é só trinta",
não me minta,
sei que mais novo
não ficarei.
Meu cabelo cai,
cabeça vira ovo
careca serei
e a vida vai...
sem me perguntar...
sem sequer chamar...

Nesses trinta
risquei tanto giz
nesse caminho que fiz,
que de dez em dez,
já perdi a conta;
já perdi a ponta;
já fiquei do contra;
já aguentei afronta;
já xinguei de "lontra";
já vi quem monta;
quem desmonta;
montes, morros
e ventos cortantes,
mortes, serras,
instantes inebriantes.
E no entanto
me pego sem pranto,
um tanto enxuto,
surpreso: num canto
vejo, debaixo dos panos
do monte que se fez,
que estou à dez
dias dos trinta anos.

--

Estou tentando entender meu lugar nesse mundo, na vida dos outros, na minha própria.
2013 foi um ano importante, no entanto, não gostaria que se repetisse. Muito sofrimento para um ano só.